Discurso de Ódio e os Desafios Contemporâneos

A Esperança de Pandora

Desde criança a gente aprende que a nossa liberdade termina quando começa a do vizinho, assim como “respeito é bom e eu gosto”. A gente vai crescendo e acaba percebendo que o que aprendemos no passado está correndo sérios riscos de se tornar “fake news” (notícias falsas) na contemporaneidade, principalmente quando buscamos nos relacionar nas redes sociais.

E o que encontramos por lá? Potenciais desencontros. A tão preconizada liberdade de expressão parece ter aberto a caixa de pandora do desamor. O discurso de ódio revela que não há limites para o desmerecimento alheio, onde o caos do preconceito, doenças do corpo e da alma se edificam a partir dos nossos próprios escombros. As pessoas que se dão ao desserviço de “viralizar” e escalar a comunicação violenta nas redes não fazem isso de forma gratuita, principalmente as que impulsionam os conteúdos inflamados de líderes e formadores de opiniões que incitam a busca de culpados para curar os tais males que acometem a pátria e as balizas dicotômicas do comportamento humano.

E como fica o estado democrático de direito nesse preocupante cenário? Qual o limite de tolerância da nossa civilidade coletiva?  Essas foram umas das questões levantadas e ricamente debatidas durante o Congresso Virtual “Discurso de Ódio e os Desafios Contemporâneos”, promovido pela Confederação Israelita do Brasil (CONIB) e Ordem dos Advogados do Brasil – Seção São Paulo (OAB SP), que ocorreu no dia 5 de agosto de 2021com apoio da Federação Israelita do Estado de São Paulo – FISESP, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – TJSP e do Ministério Público do Estado de São Paulo – MPSP. Acredito que foi o primeiro de muitos, devido a relevância e também urgência de continuar promovendo diálogos com representantes das reservas institucionais e guardiãs da carta magna, a Constituição Federal promulgada no dia 5 de outubro de 1988, que rege a nossa frágil e ao mesmo tempo, resiliente democracia brasileira.

Congresso Virtual “Discurso de Ódio e os Desafios Contemporâneos”
Congresso Virtual “Discurso de Ódio e os Desafios Contemporâneos”

 

 Plataformas de Cidadania e Inteligência Coletiva

 É atribuição de cada um de nós cidadãos e cidadãs, sermos vetores de informações verdadeiras como também, denunciantes de desinformações deletérias para nossa sanidade mental, cada vez mais à mercê de manipulações, delírios e ilusões. Mentiras ditas várias vezes não podem jamais ser aceitas como verdades. O nazismo e o fascismo são frutos venenosos do extremismo, assim como o negacionismo, terraplanismo, terrorismo, racismo, fanatismo, homofobia, machismo e tantas outras atrocidades.  E isso ficou evidente durante os quatro painéis apresentados pelos especialistas convidados.

 Um dos pontos fulcrais foi o papel do judiciário ao impor os limites e responsabilidade civil, não devendo assumir o protagonismo de solucionador do discurso de ódio. Essa dever ser sim, atribuição das plataformas digitais ao se posicionarem na linha de frente na fiscalização, combate e implementação de mecanismos de bloqueios de veiculação de pautas contrárias ao artigo 3 da nossa constituição, que prever:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II – garantir o desenvolvimento nacional;

III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Respeito as diferenças
Respeito as diferenças

 Pensamento Crítico

Aprecio muito a frase presente no livro “Rápido, Devagar, duas formas de pensar” (Editora Objetiva, 2011), do escritor Daniel Kahneman, psicólogo e ganhador do Prêmio Nobel da Economia em 2002: “podemos estar cegos para o óbvio e cegos também para a nossa cegueira”. O poder de síntese dessa sentença demonstra o grau de distração e mesmo de convicção cega quando se transmite e se recebe informações sem filtros de verificação.
As redes sociais são a soma de todos nós, lembrando que os perfis falsos impulsionados por pessoas e também robôs, são as arapucas antissociais que precisamos ficar atentos, pois eles não devem ter o poder de decidir como devemos agir.

O pensamento crítico é o fiel da balança da acuidade. A ótica da racionalidade e sensatez nos obriga a checar, investigar, questionar, “pensar o pensar”, tendo o centro de coerência como a fiel da balança no processo de conscientização. Não temos mais tempo para encenar ser vítimas das circunstâncias ao nos deixar ser ludibriados com a desculpa de que não tínhamos conhecimento.

É importante refletir sobre o nosso ímpeto de “passar adiante”, principalmente quando estamos construindo um ambiente de inteligência coletiva, onde cada um de nós é parte do todo e juntos somamos competências e experiência de vida.

Vamos então às nossas 6 dicas:

  1. Investigação: verificar a fonte, se ela realmente disse isso e em que canal de notícia. Se o canal é confiável e não só um canal de confirmação das nossas crenças. Notícias verdadeiras são baseadas em fatos e não em conveniências que melhor confortam e comprovam os nossos pontos de vista, juízos de valor, opiniões, sensações e impressões.
  2. Curiosidade: A notícia está sendo propagada em outros sites e jornais? Importante ter esse senso de ouvir outras “vozes”, a fim de saber se o conteúdo é de fato, verdadeiro.
  3. Inconformismo: importante perceber se há o contraditório na notícia, ou seja, se há outro lado da história. Não sejamos canais de teorias da conspiração, blasfêmias e difamações.
  4. Observação: leia a notícia até o final a fim de verificar se há uma conclusão que defina caminho de novas pesquisas. Não se contente com o que te parece “já esperado”. As notícias falsas são misturadas com meias verdades. Por isso precisamos aguçar nossos sentidos.
  5. Temporalidade: é preciso verificar se a notícia mesmo verdadeira, é atual. O mundo está muito rápido e o que dissemos ontem pode ser confrontado com o que falamos hoje, podendo haver mudança de posição
  6. Responsabilidade: Sejamos responsáveis pelas mudanças que queremos ver no mundo como disse Mahatma Gandhi. É crime contra a honra disseminar notícias falsas. Na dúvida, não passe adiante.

A Esperança de Pandora

 O destino do nosso bem comum será alcançado com a união dos nossos passos. O caminho é longo e farei uso novamente da obra de ficção mitológica. Reza a lenda que Zeus ficou furioso com o titã Prometeu por ele ter roubado o fogo sagrado e compartilhado com os humanos. E para nos castigar, ordenou que o deus das Artes, Hefesto, fizesse uma mulher parecida com as deusas. Atena lhe deu o sopro de vida, Afrodite, a beleza, Apolo, a voz suave e Hermes, a persuasão. Pandora (aquela que tem todos os dons) ficou pronta para ser a primeira mulher habitante do planeta. Ao descer dos céus, ao invés de mala, trouxe apenas uma caixa. Logo que pisou na Terra, Epimeteu, irmão de Prometeu, a alertou para jamais abrir o objeto, o que não foi obedecido por Pandora. Resultado: muitos infortúnios foram libertados. Assustada, ela fechou a caixa, ainda que tardiamente.

A esperança foi a única força transformadora preservada por Pandora e nós somos os remanescentes do fogo sagrado que Prometeu nos deu. Temos Afrodite como farol apontando a direção da justiça, paz, beleza, amor e abundância.  Façamos bom uso do nosso talento, pois acredito ser pecado desperdiça-lo.

Para concluir, deixo algumas perguntas: que ser humano queremos ver prosperar no planeta? O que estamos deixando como legado? Como estamos nos reinventando?  Quanto mais refinarmos a nossa natureza, mais conscientemente planetários seremos. Façamos do hoje o novo começo na nossa caminhada tendo a liberdade de expressão assistida e o respeito mútuo como verdadeiros e inseparáveis companheiros de jornada.

Link da cobertura completa do Congresso Virtual:

Discurso de Ódio e os Desafios Contemporâneos

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Jacqueline Moreno é jornalista, escritora, tradutora, intérprete simultânea, educadora e pesquisadora na área de inteligência coletiva e cooperação. É diretora executiva da Vegah Soluções em Comunicações Internacionais e da plataforma criativa Efeito Sol. É baiana cidadã do mundo, ativista na área educacional na estruturação de redes de fortalecimento feminino e na defesa do meio ambiente. É comunicadora voluntária da UJR União do Judaísmo Reformista onde contribui como jornalista, editora e tradutora.

2 Comentários em Discurso de Ódio e os Desafios Contemporâneos

    • Concordo Antonio! Precisamos perseverar nessa coinciência cidadã para desenvolver a nossa cooperação e inteligencia coletiva! Obrigada pelo ocmentário!

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